quinta-feira, fevereiro 03, 2005

Hoje acordei (V minus 65 horas) com um brazuca a passear pela casa. Naturalmente, a minha reacção, ainda antes de abrir os olhos, foi: "Bolas, que tipo de estupefacientes é que me obrigaram a ingerir sub-repticiamente pra não me lembrar de todo de 36 horas de viagem?"
(é ridículo, eu sei, mas tenho uns acordares um bocado alucinados, especialmente se me despertam a meio de um sonho).

Mas depois verifiquei que o meu irmão mais novo estava-se a esforçar desesperadamente por ser simpático com um ser que ele tinha como membro de uma raça inferior ("Esta malta das colónias... pff, havia de ser eu..."), e lembrei-me que o tecto da sala tinha caído e a minha mãe tinha arranjado mão de obra escrava para o arranjar (atenção, isto é só uma metáfora... nós pagamos-lhes; ouviram, gentis senhores da Inspecção Geral de Trabalho? E é óbvio que têm permissão de residência, nós nunca, mas nunca, empregaríamos mão de obra ilegal).

É evidente que viver numa casa onde, a qualquer instante, o tecto nos pode cair em cima faz maravilhas pela nossa qualidade de vida. Não só temos algo de gazelas acossadas na pradaria africana, sempre atentos ao ataque súbito de um inimigo súbito e imprevisível, como o nosso sono se torna mais leve e intermitente que o de um gato (eu sei isto porque tenho comparado... claramente o nosso gato ainda não se apercebeu do risco que lhe pesa sobre a cabeça).

O único problema é que começamos a ser acometidos de tiques nervosos que, a quem não esteja familiarizado com o problema (como parece ser o caso dos meus pais), são em tudo idênticos a uma ressaca: intolerância a sons elevados, algum medo da luz, não vá ser de um novo buraco no telhado, umas inexplicáveis olheiras, ligeiro mau humor, esse tipo de coisas.

Mas o que me vale é que não me chateiam muito com isso. Sempre que começam a insinuar qualquer coisa, atiro-lhes com um "Sim, mas Jesus Cristo é o senhor!" que gera um imediato assentimento geral (salvo do gato, esse sacrista ateu condenado a arder por toda a eternidade no Inferno) e mata qualquer conversa. É remédio santo.

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