domingo, janeiro 11, 2004

Após longa ausencia, eis que volto. E inglorio, porque ninguem me lera agora, mas nao me parece que esse seja de todo o objectivo. E um plus.

Ao que interessa. Primeiras experiencias esteticas do novo ano. Ambas sobre a America. Perspectivas diferentes. Tradicionais, todavia. Mas os criadores nao tem as caracteristicas que se esperariam.
Uma e de um americano que se mostra profundamente desagradado como o seu pais, pese embora claramente nao gostar de franceses. Mas isso nao o tornara suspeito na veracidade das suas criticas (salvo para os franceses, suponho).
Outro e de um emigrante que nao consegue esconder o quanto gosta do seu novo pais. Um irlandes de gema, virado para a irlanda, faz uma ode as possibilidades e a esperanca no novo mundo.
Por partes:

1- O livro "The human stain", de Philip Roth



Nunca tinho nada dele. Nao vi o filme.
Mas o livro e de uma carpintaria sublime. Nada nos e dito em primeira mao do que acontece as personagens, mas nao e por isso que nao queremos saber o desfecho da historia. Poucas personagens ha que nao sejam de uma complexidade psicologica rara, mas mais complexa e a realidade historica que se sobrepoe.
Sao fabulosas as ligacoes emocionais que se estabelecem, em quantidade e qualidade, mas nao e por isso que deixa de ser uma profunda historia quase exclusivamente sobre a raiva de um homem. A personagem principal tomou literalmente o destino nas suas maos, e descrito como o mais acirrado dos individualistas, mas nao e por isso que a Historia deixa de condicionar o seu comportamento, e o de todos os outros personagens. E patente o fascinio do autor pela America, mas tambem a imensa critica que lhe faz.
Mas talvez seja por isso que, com Norman Mailer, alguns considerem Roth o maior romancista americano vivo. O que releva e a catarse, que e algo que os americanos tem capacidade para fazer como nenhum outro povo na cultura ocidental.
A catarse tal como veio transportada da tragedia atica, como fim ultimo dessa tragedia, como forma de provocar a reflexao interior e sentimentos de piedade.
E e como uma tragedia que o livro esta construido, talvez ate um pouco mais, porque de uma forma muito americana nos permite observar o ritual purificador que a catarse e para as proprias personagens.
A noçao de luta contra o destino como algo de infrutifero, sendo este destino ja nao algo resultante do fiar das Parcas mas uma determinante historica irremovivel, leva-me a concluir que este livro e um dos mais finos exemplares da digna tradicao de Sofocles.

2- In America, de Jim Sheridan



E um belissimo filme. Aqui a América é mais um cenário para uma história de tragédia e redenção familiar. E a visão do recém chegado ou do estrangeiro: a América ainda como uma terra de oportunidades. Como local de lutas e desespero, mas principalmente de esperança. O facto mantem-se: a America continua a ser melhor sitio para viver que 95 % do mundo. E o unico para onde todos se podem mudar, porque e um pais que se orgulha dessa sua tradicao de acolhimento.
E e também um pais para onde se pode fugir. E o centro do mundo, nao so pela sua capacidade de atraccao, mas tambem pela facilidade com que acolhe. E americano quem o escolher ser. Isso e fabuloso, a nivel de ideias, de estrutura, de acumulacao de meios.
Tudo se podera alterar la, In America. Nao por si so, com esforço. Mas quem quer ser americano deve aderir a esta mentalidade (so os que ja o sao se podem dar ao luxo de a contestar).

Apenas duas notas:

a) a miuda na fotografia e uma fabulosa actriz que, a meu ver, carrega o filme as costas ( e vai ser gira, ainsda por cima). A sua irma mais nova tambem atrai atencoes, ate pode haver quem a prefira: mas o peso dramatico que lhe cai nos ombros e imenso. Espero voltar a ouvir falar dela.

B) a cena que mais me emocionou e a chegada da familia a Times Square. Como os percebi. O que não deixa de ser curioso, já que nunca fui a Nova Iorque. Sou um estrangeiro e potencial emigrante clássico da História Americana: estou apaixonado por um horizonte que nunca conheci.

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