sexta-feira, janeiro 12, 2007

O típico português adora apresentar como suas ideias desenvolvidas numa qualquer língua estrangeira

Mas isto até é um bom resumo de um (óptimo) artigo da Harvard Business Review:

O trabalho como desporto radical

Miguel Pina e Cunha (Director de MBA na Universidade Nova de Lisboa)

Uma das novidades do mundo do trabalho a partir de finais do século XX foi o final do horário de trabalho normal tal como um dia o conhecemos, isto é, das nove às cinco. As empresas começaram a flexibilizar os horários, foi nascendo a cultura dos dias longos e ganhou corpo a ideia de que o bom trabalhador é aquele que passa muito tempo na empresa. Estar presente passou a significar estar empenhado. Em alguns sectores, acrescentar a este quadro uma "directa" ocasional constituía a cereja no topo do bolo.
A cultura do presentismo tem evoluído em diferentes direcções. Algumas empresas têm procurado desmantelar o horário de trabalho, dando ampla liberdade de escolha aos seus membros. Outras procuram recuperar a lógica anterior: regressar ao horário certo de entrada e de saída. Noutros casos, porém, a cultura dos longos horários evoluiu para algo ainda mais radical: o trabalho extremo. As características do trabalho extremo estão indicadas na caixa que acompanha o texto. Em traços gerais, as funções extremas implicam horários longos, ritmos rápidos, alto nível de responsabilidade e deslocações frequentes. Por vezes, a necessidade de trabalhar com regularidade em vários fusos horários implica a submissão do organismo a ritmos irregulares, reuniões fora de horas e longas viagens intercontinentais.
Embora a dureza destas funções possa parecer uma enorme fonte de stress e mesmo de esgotamento físico e psicológico, os seus titulares tendem a expressar o prazer que elas lhes transmitem. São, por assim dizer, funções ricas em adrenalina. Os seus titulares referem-se-lhes como "É o meu Evereste" ou comparam-nas a desportos radicais. São um teste ao valor próprio e um motivo de orgulho. Além das compensações materiais, os trabalhadores extremos referem as recompensas psicológicas - que incluem trabalhar com colegas inteligentes e ambiciosos, estar no centro e no topo do negócio, ter um alcance e um impacto global e apreciar o status que acompanha a função. Com toda esta estimulação ocupacional, a semana de trabalho de 40 horas parece coisa do passado e mesmo a de 60 horas é por vezes vista como um part-time. Para estes profissionais, a empresa torna-se o centro da vida social. Quando assim é, mesmo se não há trabalho urgente para fazer vai-se ficando a tratar de outras coisas ou a jogar Solitaire.
As generosas compensações materiais e psicológicas não escondem um leque de consequências nefastas, reconhecidas pelos ocupantes de funções extremas: a capacidade de manter um lar equilibrado enfraquece, as relações com os filhos ressentem-se, a qualidade da relação com o cônjuge degrada--se e a vida sexual torna-se menos satisfatória. Alguns trabalhadores extremos referem mesmo que, por vezes, antecipando o regresso a casa, vêem um frigorífico vazio, um adolescente que cresceu desacompanhado e um marido/mulher de quem se está cada vez menos próximo. Como resultado desta antecipação resolvem ficar mais um bocado, para dar um retoque adicional no powerpoint que será apresentado no dia a seguir. Em suma, quando se trata de trabalho radical, se os ganhos são grandes, as perdas acompanham-nas.
Para desenvolver o tema:Hewlett, S.A. & Luce, C. B. (2006). Extreme jobs: The dangerous allure of the 70-hour workweek. Harvard Business Review, Dezembro.

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