segunda-feira, maio 15, 2006

Do conceito de sorte

Ontem, os dois melhores jogadores do mundo bateram-se durante mais de 5 horas em Roma. O vencedor declarou que teve sorte; o derrotado deixou sub-entendido que não era aquele o jogo que interessava.

Um tipo ganha milhares na lotaria, é sorte. Um tipo ganha milhares na bolsa, tem que ter um bocado de sorte. Um tipo gosta de ténis e não se dá conta que está perante aquela que pode vir a ser a maior rivalidade da História do desporto, é um perfeito imbecil.

Senão vejamos: de um lado temos Rafael Nadal (na foto em baixo em modo bailarina consumidora de testosterona).









































Este rapazola de dezanove anos, sobrinho do lendário defesa central do Barcelona com o mesmo nome, ganhou todos os jogos em que participou este ano, foi o primeiro jogador a ganhar todos os Masters Series e o Grand Slam em terra batida no mesmo ano, igualou (e vai bater) o record de vitórias consecutivas em terra batida (do lendário Guillermo Villas) e o record de número de torneios ganhos com menos de vinte anos (do ainda mais lendário Bjorn Borg). É destro mas joga como canhoto, o que quer dizer que a forehand sai como forehand, e a backhand também sai como forehand. Estatisticamente será, portanto, o melhor teenager da História do desporto.

Ah, e tem um record de 5-1 a seu favor com aquele que será o jogador mais talentoso de todos os tempos (em baixo, na foto. Recuso-me a dizer o seu nome, e se o leitor não o conhece, deve abster-se de ler o que vem abaixo, abandonar este blog e só voltar quando o conhecer).















Este moçoilo detém o recorde de maior número de finais ganhas consecutivas (24, quando o anterior record era de 12). É o primeiro jogador a ganhar Wimbledon e o US Open em anos consecutivos; o primeiro jogador a ganhar dois Grand Slams no ano seguinte a ganhar trêsGrand Slams (o que, de qualquer forma, já ninguém fazia desde 1988). É o número um do mundo, ininterruptamente, há 120 semanas (a 37 semanas do record). Bate esquerdas, direitas, volleys, amorties e serve ao nível dos melhores de sempre, sem pontos fracos. E ainda sabe tocar piano.

Mas o fundamento desta rivalidade não é esta. Federer apenas perdeu três jogos, três finais, este ano, todas contra Nadal. E claramente, quer-lhe ganhar. Mas não lhe quer ganhar um jogo qualquer, quer-lhe ganhar no dia 11 de Junho de 2006, no dia em que, se o fizer, começará a ter uma hipótese razoável de ser considerado o melhor jogador de todos os tempos, e com apenas 24 anos.

Com 7 Grand Slams ganhos, incluindo os últimos três, e jogando em terra batida como só Nadal parece fazer melhor, Federer tem a hipótese de fazer um Grand Slam, algo inédito há quase 30 anos (desde 1969), e que só o inimitável Rod Lavour fez, e por duas vezes, quando só Roland Garros não era jogado em relva. Se ganhar poderá ser o primeiro jogador a ter ganho os 4 torneios do Grand Salm consecutivamente sem serem todos ganhos no mesmo ano, sendo que Wimbledon é dele para perder (não perde um jogo em relva desde 2002) e não perde nos Estados Unidos desde 2003.


Portanto, temos um despique entre o melhor jovem jogador (e possivelmente também o melhor jogador de terra batida da História), contra o jogador mais versátil e virtuoso nos anais do ténis (em busca do início da sua consagração como o melhor de sempre).

Se chegarem os dois à final de Roland Garros, pode ser um jogo para a História do desporto: do lado de Federer, há a possibilidade de fazer um Grand Slam da forma mais heróica, no terreno do melhor jogador do mundo em terra batida, para mais virando uma sequência de 5 derrotas seguidas. Já Nadal entrevê a consagração como melhor jovem da História do ténis e a possibilidade de começar a ser considerado desde já o melhor jogador de terra batida da História.

Seeste embate acontecer dia 11, eu direi que tive sorte.